21 de janeiro de 2010

A Sindroma da Alienação Parental

A justiça e a comunicação social ofereceram-nos nos últimos dias diferentes abordagens da Sindroma de Alienação Parental, que a OMS não reconhece e a DSMIV não identifica.
Traduzindo por miúdos, porque é efectivamente um assunto de miúdos, após o divorcio, um dos pais, em regra a mãe, porque geralmente é esta a cuidadora, (e ainda que não fosse, desde Freud a culpa de qualquer trauma é invariavelmente da mãe), faz supostamente a cabeça dos miúdos para não quererem ver ou estar com o pai. E face a isto, pronunciam-se todos: juízes, juristas, advogados, pedopsiquiatras, psicólogos, jornalistas. Falam da suposta Síndroma, questionam a legislação, esgrimem argumentos sobre o direito à parentalidade, o equilíbrio dos pais cuidadores, a saúde mental das crianças, e tudo o que mais se queira….

Este assunto incomoda-me, e a reportagem da RTP sobre a Maria, que acabou institucionalizada, e só pode ver a mãe uma hora por semana, por sofrer do suposto Síndroma arrepia-me até à medula e fez-me perder uma noite de sono.

Todos sabemos que o mundo não é perfeito, todos sabemos que o divórcio pode ser o fim ou o princípio de uma guerra de adultos onde as crianças são facilmente manipuladas, todos conhecemos o mal que por vezes se faz em nome de um suposto bem, todos em algum momento da nossa vida já alcançamos objectivos sem estar muito atentos aos meios que utilizamos (ainda que inconscientemente), por tudo isto, e muito mais, tenho dificuldade em aceitar esta Sindroma como argumento para o que quer que seja, muito menos para afastar uma criança de uma mãe, boa cuidadora e afectuosa, ainda que com o coração cheio de ódio pelo outro progenitor do seu filho. Pergunto-me também que pais cheios de ódio são estes, que recorrem a tribunal e preferem ver os seus filhos institucionalizados a deixa-los viver com as suas mães. Sei que o argumento é discutível mas apetece-me avocar a história do Rei Salomão quando duas mulheres afirmavam ser mães da mesma criança, e o rei ameaça mandar cortar a criança ao meio, decidindo por fim dar a guarda da criança àquela mulher que cedeu em entregar a criança à outra mulher para que a criança não fosse morta. Parece-me que um bom pai, deve saber recuar temporariamente, desistir se necessário, pelo bem-estar do seu filho. Talvez o filho um dia possa reatar a relação e compreender este “abandono”, mas certamente nunca lhe perdoará o tempo de institucionalização.


Nota: A autora do post faz aqui uma declaração de interesses: há 40 anos foi supostamente vítima da “ síndroma de alienação parental”. Uma separação na década de 60 era uma guerra sem fim, que envolvia ódios colossais, aliás essa guerra só acabou com a formalização do divórcio dos pais em 76, quase 10 anos depois. Viveu sempre com a sua mãe e a sua família materna, adoecia todos os domingos da visita, e o seu pai, quando ela tinha 3 ou 4 anos, desistiu dos encontros domingueiros a troco da poupança da pensão de alimentos. O juiz quando ela tinha 9 anos perguntou-lhe a sua opinião sobre o assunto. [Ela nunca se esqueceu daquele juiz barbudo que a ouviu atentamente e compreendeu a sua opção- devia ser comunista!-]. Cresceu saudável e mais ou menos feliz, como toda a gente, e não lhe aconteceu nada de mal, antes pelo contrário.
Se tivesse sido institucionalizada a sua história seria certamente outra…

11 comentários:

Unknown disse...

Pois...
há "cenas" que enervam imenso!!!!
Há "cenas" que custa a crer que aconteçam... mas acontecem.
E deixam marcas...
Um beijo!!
MH

leitanita disse...

Abracinho minha mana!

Os pais/maes/esposos escolhem-se, trocam-se etc... os filhos esses são para sempre!

Totalmente de acordo.Como eu te compreendo!
E tu SABES muito bem do que eu estou a falar...

Xanuca B disse...

abraço apertado amigas. saudades.

kristina disse...

Li o teu commentario e sei bem o que queres dizer porque eu sou uma mãe Salomão !
Pois é há mais ao menos um ano e meio um juiz pediu me para ser mãe Salomão mas até hoje foi a pior coisa que eu fiz !
Pois é "é que de boas intenções está o inferno cheio !"
Eu aceitei ser e desde esse dia nunca mais estive com o meu filho!
Estou em luta e continuarei até não poder mais pura e simplesmente para poder comigo o meu filho de 15 em 15 dias !

Xanuca B disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Xanuca B disse...

Kristina, não posso ser mais solidária contigo. Jamais me poderia imaginar sem o meu rapazinho. A conversa so Salomão era para os pais, não para nós.

Abraço

Anónimo disse...

Vi até aqui através do blog Cocó na Fralda, este é um assunto (Alienação Parental) que infelizmente não me é estranho.

Passo a citá-la:

1 - "após o divorcio, um dos pais, em regra a mãe, porque geralmente é esta a cuidadora, faz supostamente a cabeça dos miúdos para não quererem ver ou estar com o pai" - Supostamente? Efectivamente isso acontece, já foi provado em tribunal. A OMS não a reconhece como doença mas isso não faz com que não seja verdadeira. Muitas doenças de foro psiquiatrico só recentemente foram reconhecidos como tal.

2 - "tenho dificuldade em aceitar esta Sindroma como argumento para o que quer que seja, muito menos para afastar uma criança de uma mãe, boa cuidadora e afectuosa, ainda que com o coração cheio de ódio pelo outro progenitor do seu filho." - Então e se esse ódio não permitir que a criança tenha um saudável relacionamente com o pai, isso fará dela uma boa "cuidadora"?

3 - " Parece-me que um bom pai, deve saber recuar temporariamente, desistir se necessário, pelo bem-estar do seu filho." - E não deverá também uma boa mãe recuar e desistir do seu "ódio" pelo bem-estar da criança?

4 - O facto de haver crinças, como parece ter sido o seu caso, de crescerem felizes apenas com um progenitor, não faz regra para todos os casos. Há casos de falecimento por exemplo, completamente diferente de um "suposto" abandono por parte do pai. É muito importante a envolvente real de cada história.

Lamento que nem toda a gente compreenda que não se trata de um direito do pai mas um direito dos filhos.

Não tenho por hábito fazer uma distinção entre pai e mãe, sim é verdade que o poder paternal é, regra geral entregue às mães e em casos de Alienação Parental são geralmente os pais que sofrem, mas existem excepções como o da Kristina que nos mostram o contrário. Ou será que um caso igual ao da Kristina mas com os papeis invertidos já não seria tão escandaloso? Afinal a " conversa de Salomão era para os pais", nao para as mães...

Isabel

Xanuca B disse...

Isabel, não me posso desenhar em cenários paralelos. Mas certamente teria sido mais feliz, se tivesse tido pai e mãe. Não tive. Eles entraram em guerra, e não me souberam poupar. Pois sim. O pai era mau, o pai era horrivel, o pai bateu na mãe. Eu não o queria ver. Não o quis ver. E depois, eu merecia ter sido institucionalizada por ter sido manipulada contra o pai?

A minha questão é esta, a da Maria, a história que podia ter sido a minha.
E já agora, não tenho problema nenhum em assumir que premaneço (conscientemente) do mesmo lado da barricada, o das mães cuidadoras, aquelas que querem mesmo os filhos e fariam qq coisa por eles, nem que seja com o coração cheio de ódio pelo ex-companheiro.

Anónimo disse...

Obrigada Xanuca por responder. E gostei da sua resposta. Não quis entrar na sua vida privada mas ontem questionei-me também sobre si, o seu caso e estive para lhe perguntar como é o seu relacionamente com o seu pai, se é que existe. Mas não tenho nada a ver com isso. Agradou-me a sua resposta por isso mesmo por dizer que "certamente teria sido mais feliz com pai e mãe".

A verdade é que todos nós nos sentimos mais ligados com os casos próximos de nós, parecidos, dos quais entendemos as magoas. Não conheço o casa da menina que fala, mas sei que existem maus pais tal como existem más mães. Não dúvido das mágoas e ressentimentos que se possa ter de um ex-marido mas um ex-marido nunca é um ex-pai. E é este ponto que me magoa, por algumas mulheres (e homens) não separarem isso e transmitirem aos filhos a imagem de que têm um pai mau (ou má mãe).

Peço desculpa pois realmente não me queria alongar no comentário.

Isabel

Anónimo disse...

Olá X,

Em primeiro lugar quero pedir desculpa por entrar em contacto contigo desta forma, mas é unica que conheço e consegui atravéz
do facebook.
Deves ficar admirada ao fim de tantos anos eu aparecer assim, mas isso deve-se ao teu blogue e a um artigo teu no mesmo com o titulo
(A Sindroma da Alienação Parental)
A história está correcta como tu contas, mas o que eu pretendia não foi o que aconteceu.
Não me pretendo desculpar mas sim esclarecer.
Tenho tambem bem presente esse dia perante o juiz como se fosse hoje. Tinha sido acordado anteriormente pelo juiz de menores que eu
estaria contigo todos os domingos depois do almoço até á hora de jantar. Isto raramente aconteceu porque a tua mãe telefonava na véspera ou no dia
a dizer que tu estavas doente por vir ver o pai e que te prejudicava a escola.
Eu achei que situação não podia continuar, eu como pai tinha o direito de te ver e entreguei o caso ao meu advogado.
Quando fomos ao juiz tinhas tu 9/10 anos, eu disse ao juiz que se tinha deveres tambem tinha direitos e que se não te podia ver tambem não tinha
que enviar a pensão de alimentos. ( Isto foi a minha forma de forçar a situação, para poder estar contigo.)
A tua mãe aceitou a minha proposta com espanto meu, ela realmente não queria como está provado que tivesses contacto comigo e a minha familia.
Mas pior ainda esteve o juiz feio barbudo e comunista conforme tu o descreves,ele não devia ter aceite a minha proposta nem a concordância da tua mãe,
mas sim fazer cumprir a lei da altura.
Este juiz com a sua decisão alterou o que podia ter sido uma história com um fim feliz.
Nunca te quis tirar á tua mãe sempre achei que devias estar com ela.
Há tambem uma coisa que todos os meus amigos e não só, sabem que eu sempre digo e disse que tenho três filhos e uma é do meu primeiro casamento.
Gostava de um dia poder falar contigo para me conheceres e verificares quem eu sou realmente.
Já tenho 64 anos tu 43 o tempo voa e acho que era importante falarmos sem ressentimentos.
Fico feliz por saber que és uma mulher bonita feliz e que conseguiste os teus objectivos, e que tens um filho muito bonito.

JCB

Xanuca B disse...

JC,
Li e reli a sua mensagem.
Confesso que ponderei muito antes de lhe responder.
Comecei por ficar muito zangada com a sua "descoberta" de mim ao fim de mais de 40 anos. Mas o facto é que se tenho um perfil no facebook e escrevo blogs, tal obriga-me à ética de assumir os riscos e a responsabilidade de me expor publicamente, ainda que fantasie sempre que escrevo ou para os meus amigos ou para anónimos, o que me protege.
Torna-se assim estranho, receber feedback de um post de alguém que nem é uma coisa nem outra. O senhor não é um anónimo, o seu nome consta no meu BI, mas também não é um amigo, porque não o conheço. Mas eu não sou capaz da indiferença, nunca fui, talvez por ter sido vítima dela, por isso decidi responder à sua mensagem.
Sou quem sou, fiz as escolhas que fiz, percorri uns caminhos e não outros, porque vivi a minha história. Aquela em que participou, ainda que, por omissão. E nesta história não foi o senhor a vítima, fui eu: de abandono pela sua parte e da "sindroma de alienação parental" ou manipulação, como lhe queira chamar, não tanto pela minha mãe, mas pela minha avó. E pode acreditar que eu ficava mesmo doente, cheia de febre, naqueles famosos domingos de visita, dos quais tenho vagas lembranças.
Pressinto nas entrelinhas das suas palavras que me escreveu para exorcizar alguns dos seus fantasmas, numa tentativa de se reconciliar com o seu próprio passado. Mas não o posso ajudar, aliás só o senhor se poderá ajudar a si próprio, quando entender que a responsabilidade desta história não foi do juiz barbudo (já agora, aquilo de lhe chamar comunista foi um elogio pela sua “modernidade” e capacidade de me ouvir), nem da família P., mas sua: por omissão, por ausência, por abandono. Quando viu que a sua estratégia inicial não colheu, (assumindo que aquilo que escreveu é a verdade efectiva e não já a sua verdade romanceada pelos mais de 30 anos que decorreram desde aquele evento) poderia sempre ter tentado, e voltado a tentar, e negociado, e feito tudo e mais alguma coisa, e ainda que nunca tivesse conseguido eu saberia que em algum momento da sua vida me tinha querido como filha. Mas ao invés, conformou-se, desistiu, optou pela situação mais cómoda, mais fácil e mais barata.

Mas factos são factos. A história, como sabe, não é reconstruível. Aquilo que para o senhor foi eventualmente uma ocorrência menos feliz do seu passado, um desvario do início da idade adulta, um incidente, (que eu até posso compreender porque vocês eram apenas uns jovens perdidos e irresponsáveis), para mim foi um evento definitivo, uma marca indelével, que condicionou quem sou. Se o seu abandono e negligência já não me doem as cicatrizes estão cá e hão-de morrer comigo. Eu não tive, não tenho e nunca terei pai, e essa foi uma realidade difícil com a qual tive de aprender a viver. É certo que fui criada por um homem bom, muito especial, que sempre cuidou de mim como filha, que amo, que é o avô do meu filho, mas que não é o meu pai.
Compreendo que diga que tem 3 filhos, mas isso é uma inverdade, não tem, só tem 2. Só levou 2 à escola, ao médico, ao cinema, à discoteca, só ofereceu presente no Natal a 2, só beijou 2 nos seus dias de aniversário, só adormeceu 2, só recebeu presentes de 2 no dia do pai, só sustentou, cuidou e amou 2, só vai ser avô dos filhos deles. Por isso, não me venha pedir para não ter ressentimentos, porque tem de convir que tenho toda a legitimidade para os ter.
Do mesmo modo terá que compreender, e aceitar, que eu diga a todos que sou filha única e jamais tenha usado o seu sobrenome.
Estamos assim perante um embaraço irremediável, impossível de resolver, dadas as nossas circunstâncias: nunca poderemos reaver o que não tivemos de relação parental, nem poderemos ser amigos, ou sequer conhecidos porque seremos sempre reféns da história comum que não tivemos.
Sem mais,

Xanuca B.